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Autoridades na Luta Pelo Parto com Dignidade

9 de maio de 2019

Em uma época remota, havia uma diferenciação que os romanos faziam de potestas, aqueles indivíduos que tinham poder por estar em um cargo e auctoritas, aqueles que obtêm seu poder pelo reconhecimento de sua capacidade de produzir, força intelectual e moral. A categoria médica tornou-se uma das mais tradicionais e respeitadas pela sociedade, decorrente do reconhecimento pela dedicação, serviços prestados, ética, conhecimento intelectual, etc. Entretanto, em época recente, tornou-se alvo de um grupo que tenta revolucionar o mundo, com ímpeto crescente contra “autoridades”, sejam elas potestas ou auctoritas.

Como representantes deste grupo estiveram à frente de políticas públicas de saúde, em muitas situações recentes de falhas na atenção à saúde, a responsabilidade foi, sempre que possível, transferida para a categoria médica. Talvez por ser uma categoria que não se alinha automaticamente aos grupos no poder e mantem a cobrança de melhorias nos serviços de saúde.

Em aspectos relacionados ao período gestacional, as entidades medicas denunciam há décadas a falta de estrutura e de programas para assistência pré-natal e durante o parto nos serviços públicos. Falta de condições, que levou a uma crise que se agudizou nos últimos anos com:

 

1-      Indisponibilidade de atendimento por médico obstetra para atendimento pré-natal e aumento da mortalidade materna.

 

2-      Falta de penicilina benzatina e uma Portaria irresponsável de um ex-Ministro da Saúde que se associaram ao aumento da sífilis neonatal.

 

3-      Fechamento de leitos obstétricos e maternidades superlotadas, com gestantes dando à luz no chão, em carros, ou em enfermarias apinhadas de pacientes.

 

4-      Ausência de anestesistas na maioria dos locais e muitos trabalhos de parto com dor e estresse desnecessários.

 

5-      Leitos neonatais insuficientes e denúncias recorrentes de morte de recém-nascidos.

 

Ao invés de buscar as causas para estes problemas muitos preferiram desviar o foco da atenção para a categoria médica e denunciar que o médico pode fazer mal (?) ao binômio mãe-filho. Afastar o médico, o quanto possível, virou meta destes gestores e ideólogos. Como fazer isto sem provocar reação na população que deseja ser atendida por médicos? Criando teorias pelas quais:

 

1-      É importante “desmedicalizar” o atendimento e repassar atribuições a outros profissionais (enfermeiros, doulas, agentes de saúde, etc).

 

2-      O parto é um evento de saúde, não é doença, e dispensa atendimento em hospitais ou maternidades. Esqueceram apenas de criar pelo país estruturas para garantir partos com segurança fora destes ambientes.

 

3-      O importante é “humanizar o parto”. E focaram o discurso nas vantagens (indiscutíveis) de ter um acompanhante. Mas não garantiram leitos nem para as gestantes.

 

4-      Se a paciente sentiu dor intensa, se não deixaram um acompanhante com a mesma, se houve algum estresse emocional ou desentendimentos com a equipe de saúde a paciente deve ser alertada que pode ter sido vítima de “violência obstétrica”.

 

Este termo criado e utilizado amplamente por não médicos, a maioria dos quais não participa do atendimento a pacientes, ultrapassou os limites da razoabilidade, levando o Ministério da Saúde a se manifestar. Em Despacho, o Ministro Mandetta afirma que este termo não agrega valor às discussões sobre os problemas no atendimento materno-infantil e deve ser evitado. Surpreendentemente, o comunicado foi rebatido pela OAB que alegou que este despacho “dificultará a identificação da violência de gênero”.

Manifestamos aqui nosso apoio ao Ministério da Saúde e estranheza com o posicionamento aparentemente confuso da OAB que acreditou que violência obstétrica tem algo a ver com violência contra a mulher. Data vênia a experiência da OAB com a terminologia legal, concordamos com a definição da ONU para violência que pressupõe: “o uso intencional de força física ou poder…”.

Neste sentido, a violência contra a mulher continua sendo crime ultrajante e de notificação compulsória.  A falta de empenho, investimentos, programas organizados para gestantes e criança recém-nascidas são também inaceitáveis. Se a OAB considera que fazem parte de uma estratégia intencional e criminosa dos últimos governantes para promover violência contra a mulher, que os denuncie.

Como representantes da categoria médica, conclamamos a OAB para que mantenha a tradição de defender a população brasileira contra ilegalidades, apoiando os CRMs /CFM e sociedade na luta contra a corrupção e impunidade. E que, ao manifestar-se sobre o atendimento a gestantes e recém-nascidos se abstenha de defender um termo criado para desmerecer de forma preconceituosa a categoria médica.

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